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Largando o emprego de 5 dígitos pra ir atrás de um sonho

Published: at 04:06

Se preferir, você pode ouvir esse artigo em formado de podcast aqui

No momento que eu escrevo esse texto, estou em um ônibus que acabou de sair de Berlin, Alemanha, e está indo sentido Varsóvia, na Polônia.

E tem um pensamento aqui na minha cabeça me atormentando com relação a uma decisão que tomei recentemente: será que eu tô indo pro caminho certo? Será que eu não tô jogando uma oportunidade fora?

Será que eu tô louco?

Eu tenho certeza que você já pensou isso pelo menos uma vez na sua vida. No meu caso, se fosse só uma vez, estaria bom. Mas eu perdi as contas de quantas vezes já tive essa sensação.

Ao mesmo tempo, eu sinto que estou fazendo a coisa certa. Que estou fazendo o que eu quero fazer. Que é a hora de fazer isso e que eu tenho que ir com medo mesmo.

Em 2005, há quase 20 anos atrás, eu conheci uma moça no Orkut. Se você nunca ouviu esse nome, o Orkut foi uma das primeiras redes sociais que se tornaram populares aqui no Brasil onde todo mundo que usava a internet tava lá. O motivo de deu ter “conhecido” essa moça é que, navegando pela rede social, eu vi que no perfil dela ela tinha colocado a letra de uma música de uma banda chamada Strokes.

Essa época eu ainda morava no interior de São Paulo, em uma cidade chamada Birigui. No interior, o estilo de música que a galera predominantemente gostava era o sertanejo e música popular brasileira atual. Algo bem longe de Strokes e rock indie dos anos 2000.

Encontrar uma pessoa que tivesse esses gostos por lá era bem difícil pra mim na época. Então, quando vi o perfil dessa moça, fiquei curioso e fui olhar as fotos dela. Vi que ela tinha ido no show dos Strokes e que parecia ter uma vida bem agitada na capital, bem diferente dos programas que eu costumava fazer no interior.

Adicionei ela, começamos a conversar e uma amizade foi se formando. No Carnaval de 2006, eu convidei ela pra ir me visitar em Birigui. Pois bem: ela pegou mais de 9h de ônibus da capital pra ir lá me ver. Corajosa, né?

Contexto pra você que é mais jovem: em 2006, a internet era bem diferente. A gente não tinha tanto acesso a tanto recurso em foto e vídeo pra conversar, fazer vídeo chamada e se conhecer melhor. A gente se falava às vezes por webcam usando o falecido MSN Messenger, só que nossas câmeras não tinham som.

Ou seja, ela me conhecia nesses termos fazia uns 6 meses e mesmo assim teve coragem de atravessar quase o estado de São Paulo inteiro pra ir me ver.

Depois que eu conheci essa moça a gente começou a gostar mais um do outro e eu fiquei com vontade de ir visitar ela também. Naquele ano mesmo, eu fui pela primeira vez de verdade pra São Paulo (e eu falo de verdade porque das outras vezes tinha só ido com meus pais e de passagem, dessa vez eu fui sozinho) e fiquei maravilhado com a cidade. A Camila me levou pra baladas de rock, bares onde tinha gente igual a mim e eu me senti em casa. Voltei pro interior com a sensação de que eu queria mais daquilo. Que eu não tinha nascido pra viver no interior e que a cidade grande era o lugar que eu tinha que ir.

Jogando a primeira oportunidade fora

Só que, tinha um problema: eu estava no meu segundo ano de faculdade de processamento de dados, um curso que eu já nem sei se existe mais e que era uma das graduações que a gente escolhia nessa época pra trabalhar com tecnologia e programação. Bem, era só transferir a faculdade pra capital, certo? Bem, sim. Só que, olha só: eu nunca soube exatamente o que eu queria fazer da minha carreira, nunca tive nenhum tipo de ambição ou vocação específica. Quando foi chegando o fim do colegial e meus amigos estavam prestando vestibular para várias universidades públicas e diversos cursos, eu pensei: ah, quer saber? Eu vou fazer uma faculdade por aqui mesmo e trabalhar na empresa do meu pai.

Meu pai tinha (e ainda tem) uma empresa lá em Birigui, uma empresa de desenvolvimento de software. Quando contei pra ele que iria ficar por lá, trabalhar na empresa e ser seu sucessor, ele ficou feliz. Só que, bem… me mudar pra São Paulo iria alterar esses planos, já que a minha ideia era ir trabalhar em outras empresas de tecnologia e o emprego remoto nessa época não era uma opção muito viável.

Quando falei pra ele que queria fazer isso… bem, digamos que ele não ficou feliz. Ele achava que essa mudança não fazia sentido, que eu iria perder tempo saindo de lá, que eu tinha um futuro garantido ali e que poderia ajudar a empresa a crescer mais e crescer junto com ela. A gente chegou a brigar nessa época, algo que raramente acontecia. Mas no fim das contas, eu fui. Mas fui com aquela sensação: será que eu tô fazendo a coisa certa?

Será que não tô fazendo merda?

Mas fui assim mesmo, com aquele tiquinho de medo lá no fundo. Em Janeiro de 2007, me mudei pra uma república em São Bernardo do Campo, cidade do ABC paulista que fica bem perto de São Paulo e comecei a me aplicar para vagas.

NA época eu me sentia confiante pra conseguir trabalho pois já acompanhava o mercado de tecnologia da capital, via que tinha muitas vagas em aberto e sentia que eu já tinha uma experiência ok pra minha idade e que iria conseguir algo. Consegui algumas entrevistas e a maioria delas era para vagas de estágio, pagando em torno de 800 a 900 reais na época.

Jogando a segunda oportunidade fora

Até que apareceu uma pagando muito mais… 1500, e pra ser CLT, registrado em carteira, ao invés de estagiário. Pareceu uma ótima oportunidade. Pois eu fiz entrevista e passei. Esse processo todo acabou levando relativamente pouco tempo no final. Em pouco mais de um mês depois de me mudar pra cidade grande eu já estava empregado.

Aqui, é importante a gente lembrar que em 2007, 1500 reais era mais dinheiro do que é hoje e era praticamente o meu primeiro emprego de verdade depois de ter trabalhado um tempo com meu pai. Era uma grana que eu conseguia viver razoavelmente morando em uma república que dividia com mais dois caras. Ou seja: eu estava tendo a oportunidade de começar a minha carreira em uma boa empresa, fazer carreira lá ou aprender bastante e sair de lá ainda mais preparado pro mercado.

Só que, é claro que não foi nada disso que aconteceu. Uns 9 meses depois de começar a trabalhar lá, eu pedi demissão. Eu não gostava do trabalho, tinha dificuldade em lidar com as pessoas, sofria diariamente. E aí, mais uma vez, eu joguei uma oportunidade fora. Será que eu tava louco?

Depois disso, eu trabalhei em várias empresas diferentes. De algumas fui demitido, de outras pedi demissão.

Até conseguir um emprego na Caelum, que hoje se chama Alura e trabalhar por 8 anos lá e sair pra ir trabalhar no que era a vaga de emprego dos meus sonhos, em uma startup da Estonia chamada Alvin. Conto mais sobre isso no episódio X.

Eu sugiro que você vá lá ouvir o episódio, mas se não quiser eu vou te resumir: saí do meu emprego pra ganhar o dobro de salário, com a oportunidade de aparecer para o mercado internacional e construir uma carreira foda.

Hoje, faz pouco mais de um ano que eu estou na Alvin. Aliás… estou não, estava.

E, de novo: mais uma oportunidade que se vai

Pois mais uma vez, eu decidi jogar uma oportunidade fora.

Se eu falar pra você o salário que eu ganhava na Alvin, mais os benefícios e a possibilidade de viajar pelo menos 1x por ano pra Europa com tudo pago, você provavelmente me chamaria de maluco.

Mas esses dias eu vi uma tirinha do André Dahmer que explicava de uma maneira bem simples a minha situação.

E bem… essa era assim desde que entrei na Alvin. Ganhar mais dinheiro me permitiu ter uma vida melhor em vários sentidos: pagar um personal trainer, gastar uma grana com tratamento em um endócrino bom, comprar várias coisas materiais, viajar mais. E olha, longe de mim ser a pessoa que diz que dinheiro não traz felicidade. Eu sei que, no mundo e especialmente no país que a gente vive, a falta de dinheiro pode te privar de muita coisa e trazer muita tristeza. E que ganhar um ótimo salário vai consequentemente melhorar a sua qualidade de vida e das pessoas ao seu redor.

Só que… baseado na vida que eu tinha antes e tirando alguns luxos específicos como os que eu mencionei, a minha vida não mudou tanto assim. As pessoas da Alvin são incríveis, em especial todos os brasileiros que estão lá e que são pessoas que quero levar pra vida. Meu chefe direto, o Dan, é daqueles inglêses beeeeem britânicos mesmo, com sotaque forte, humor sarcástico, um ótimo cara pra se tomar várias cervejas e conversar a noite inteira, uma das melhores pessoas com que já trabalhei.

Mas o trabalho em si, pra mim, realmente não era o que esperava.

O produto da Alvin é um software pra empresas que usam ferramentas de dados, e meu trabalho consistia em criar conteúdo técnico para profissionais de engenharia, ciência e governança de dados. O intuito final era obviamente que essas pessoas se interessassem pelo produto da Alvin e eventualmente comprassem ele para as empresas. Era um trabalho que eu conseguia fazer, mas não era algo que estava acostumado, não era natural pra mim trabalhar com isso em tempo integral me consumia muito mentalmente e fisicamente.

Aos poucos, eu fui deixando de ser um cara super entusiasmado com o trabalho e a empresa pra alguém que só fazia seu trabalho.

E aí veio meu podcast. No episódio 1, “A arte de fazer tudo mal feito” eu conto como senti que sempre fiz as coisas de um jeito que eu não considerava o ideal na minha vida e como eu poderia ter feito melhor. E que eu sempre tive vontade de ter um podcast, mas que se fosse pra começar e também fazer ele mal feito, eu não queria. E aí, nessa fase onde eu fui perdendo aquela vontade que tinha de trabalhar na Alvin, um dia me deu um estalo: talvez seja a hora de começar o podcast. Sentei um dia até mais tarde no meu escritório, escrevi o roteiro do primeiro episódio, gravei, aprendi o básicão de edição e editei, comprei uma conta no Midjourney e passei 2 dias tentando fazer um prompt que gerasse uma capa legal.

Tudo pronto, agendei, publiquei e compartilhei nas redes sociais.

O feedback inicial foi muito mais positivo do que eu tinha imaginado e esperado. Já tinha outro episódio em mente, sobre o fim da bolha em tecnologia e pensei “vou gravar”. Conversei com mais de 10 pessoas pra esse episódio, trabalhei praticamente a semana inteira nele, dia e noite, incluindo fim de semana, e coloquei no ar.

Dessa vez o feedback foi ainda maior, e o podcast subiu para o primeiro lugar na categoria tecnologia do Brasil.

Ai eu pensei: não é possível, será? Eu preciso continuar.

Encontrando o caminho

E a cada episódio que fui lançando, percebi que tinha gente disposta a ouvir o que eu queria falar, do jeito que eu queria falar. Que eu tava fazendo algo bom, algo que valia a pena investir meu tempo. Recebi dezenas de feedbacks de pessoas emocionadas com as histórias, eu mesmo me emocionei e chorei com várias coisas que recebi. E olha que eu não sou de chorar fácil, hein? E ainda assim, chorei mais vezes nos últimos 3 meses, desde que lancei o podcast do que nos últimos 3 anos.

Uma dessas vezes, em especial, foi muito significativa pra mim. Eu estava em Goiânia, passando uns dias de férias, ainda trabalhando na Alvin mas já com vontade de lagar tudo pra focar no podcast e meus outros projetos quando recebi uma mensagem do Léo, um cara que participou do do podcast contando que estava com dificuldades de conseguir um emprego e que acabou conseguindo depois de ter dado seu depoimento no podcast (se você quiser ouvir a história do Léo, escute o episódio 3 e depois o 6 ).

Mas quando eu recebi essa mensagem, eu chorei de felicidade junto com a minha esposa. Fui no banheiro, lavei o rosto, olhei no espelho e disse pra mim mesmo: é isso, cara. Desde então, eu já tinha meio que inconscientemente decidido que assim que eu visse a primeira oportunidade de sair da Alvin, eu o faria. E ela veio semanas depois.

Como eu já não estava mais tão animado com o trabalho por lá, eu comecei a focar mais e mais no podcast. Eu não parei de fazer o que tinha que fazer, só que comecei a questionar algumas decisões e maneiras de trabalhar que eu discordava que eu não tava fazendo antes simplesmente porque queria manter meu emprego.

Como eu disse: a Alvin tem pessoas ótimas e eu gosto muito dos dois fundadores, que eram as pessoas com quem eu acabava interagindo mais diretamente a maior parte do tempo. Só que os dois são europeus: um inglês e um norueguês, e eles tinham uma maneira muito diferente de mim de pensar sobre trabalho e como ele deveria ser feito. Quando eu comecei a questionar e querer fazer certas coisas mais do jeito que eu achava que era o certo, rolou um conflito e outro, até que um dia nós tivemos uma conversa bem aberta onde ambos os lados externaram sua infelicidade com o estado atual do meu trabalho.

Depois de um papo bem honesto, um dos founders propôs: e se eu deixasse de ser fulltime pra Alvin, me tornasse um contractor, vulgo PJ, e continuasse fazendo alguns trabalhos pontuais pra eles mais específicos, sem necessariamente ter que tomar decisões importantes e ser o responsável direto por uma área?

Eu preciso dizer que nessa hora, eu senti um alivio. Era isso. Era isso que eu queria. E então, em uma manhã de segunda fria em São Bernardo do Campo, eu joguei mais uma oportunidade fora: eu disse sim, vamos fazer isso.

Quando contei isso pra minha esposa, ela não ficou feliz. Afinal, por mais que ela me visse empolgado com o podcast e outras possibilidades, isso não era algo que a gente tava planejando. Eu não estava 100% preparado pra estar desempregado em breve. Mesmo porque eu já estava com viagem marcada pra Europa pra dali 2 semanas, inclusive pra encontrar o pessoal da Alvin em Tallinn para o retiro de verão da empresa. Conversamos muito, fizemos contas, traçamos planos. E no fim vimos, que dava. que valia a pena tentar e ver o que ia acontecer.

E agora?

Desde que isso aconteceu até hoje, se passaram pouco mais de 3 semanas. Nesse tempo, eu fiz o que pude pra correr atrás de trabalhos como freelancer, apoios para o podcast e empresas interessadas em fazer conteúdo em conjunto. Tem muita coisa sendo negociada e é provável que em breve a gente tenha patrocinadores e conteúdo patrocinado por aqui.

E nesse tempo, eu passei por vários altos e baixos com relação ao meu futuro. Hora eu acho que vai dar tudo certo, hora eu acho que tô fazendo uma grande cagada e que eu vou me arrepender disso. E aquele sentimento que eu falei lá no início, o de “será que eu tô fazendo merda?” me persegue constantemente. Se eu falar pra você que eu consegui relaxar 100% nessa viagem eu estarei contando uma grande mentira. Pensar sobre o meu futuro e o da minha familia tem sido algo constante, a ansiedade e o medo tem estado do meu lado.

Mas ao mesmo tempo, também sinto que tirei um peso enorme dos meus ombros e pensar que eu posso acordar na segunda-feira e trabalhar nas minhas coisas, nos meus projetos, no que eu realmente quero trabalhar me anima demais.

Não existe escolha 100% certa

E no fim das contas, essas “oportunidades perdidas” são algo totalmente abstrato que a gente cria e que na verdade não existem. Sim, eu poderia continuar na Alvin e construir uma carreira incrível dentro do que eu estava fazendo, trabalhando para empresas internacionais e etc. Só que isso tinha um preço, e um preço que eu não estava disposto a pagar.

Não existe uma escolha 100% certa, todos os caminhos tem pontos bons e pontos ruins, a gente provavelmente nunca vai estar completamente feliz com tudo e, no fim da contas, o importante é estar confortável com a escolha que a gente faz e com o caminho que a gente decidir trilhar, e fazer ele dar certo. Se não é o que a gente espera, tá tudo bem recalcular a rota, mudar de planos, recomeçar, tentar de novo.

Pra mim, as principais razões que me fazem apostar nesse caminho são: primeiro, a rede de apoio de amigos e familiares que eu tenho. Na pior das hipóteses, se eu não conseguir fazer tudo que eu imagino e o dinheiro começar a faltar, eu sei que posso contar com certos amigos e familia pra me ajudar.

Segundo, eu sinto que sou um profissional qualificado e bom no que faço e que posso me colocar de novo no mercado.

Terceiro, eu sinto que em pouco tempo de podcast, eu construi uma comunidade de ouvintes muito forte e que tá gostando muito do meu trabalho, quer que eu continue fazendo ele quer estar mais próxima como puder.

É por isso que eu decidi começar um programa de apoio, inicialmente só com um valor mensal de R$19,90, onde pagando esse valor você vai ter acesso a conteúdo exclusivo do podcast que eu vou postar no feed do Apoia.se e que vai consistir de vídeos e fotos de bastidores, gravações que não foram pro ar e muito mais. Além de acesso a um canal fechado na comunidade do Discord onde converso mais diretamente com os apoiadores e compartilho coisas que estão por vir antecipadamente.