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em carreira
Vida e trabalho na era da distração

Vida e trabalho na era da distração.

Na minha adolescência eu lia muito. Passava horas e horas diariamente devorando livros de fantasia, a ponto de esquecer de comer.
Lembro de ter lido Harry Potter e a Ordem da Fênix (um livro de 704 páginas) em dois dias.

Eu continuo lendo livros, mas eu diria que essa tarefa hoje em dia se tornou mais...desafiadora, talvez?

Não consigo ficar mais de 5 minutos lendo sem pensar em alguma outra coisa. Não importa o quão interessante o livro esteja, sem que eu perceba minha mente vai devaneando para outras coisas: o que eu vou fazer de janta hoje? Será que já me responderam aquele email? O gato tá com fome, será?

Fora os ímpetos súbitos de querer pegar o celular (que geralmente tá ali do lado) e checar as notificações do twitter, coisa de 15-20 segundos, mas que pode se extender por 1-2 minutos ou mais.

Preciso confessar uma coisa: quando eu acabo de publicar um vídeo, tuitar algo ou até mesmo agendar esse post, eu fico bastante ansioso esperando as reações e respostas das pessoas. Checo as estatísticas e notificações de 1 em 1 minuto. Ando com o celular enquanto faço tarefas de casa e fico de olho. Mais de uma vez eu já fiquei embaçando pra entrar no banho porque lá eu não ia poder checar as notificações. Mais de uma vez durante o banho eu já senti vontade de abrir o box, pegar o celular em cima da pia e ver se alguém tinha comentado no meu vídeo.

Se eu tô trabalhando, tô também ouvindo música e respondendo gente no Whatsapp e Slack. Se eu tô cozinhando, limpando ou fazendo alguma outra tarefa de casa, tô com o celular no bolso e o fone ouvindo podcast. Se eu tô jogando vídeo game, os 15 segundos que demora pra carregar uma cena já tô checando as notificações.

Ontem era meia-noite em ponto quando eu e minha esposa paramos de assistir tv, eu peguei meu celular e pensei "vou só dar uma checada nas coisas e vou dormir". 00:51 e eu tava vendo vídeos aleatórios. Já tava morrendo de sono mas eu sentia que, no fundo, não queria parar. Não queria desligar minha mente.

Eu não preciso nem perguntar, porque sei que você, em um grau menor ou maior, se identifica comigo de alguma forma.

E não é à toa: bilhões de dólares são gastos em tecnologia e em pessoas especialistas em criar novos tipos de distrações, com a intenção de captar nossos pequenos momentos de atenção cada vez mais. Isso é permanente.

Conforme vou ficando mais velho percebo que, profissionalmente falando, só consigo atingir objetivos de longo prazo se eu focar de verdade no que preciso fazer pra que eles aconteçam. É um esforço diário e constante. Com cada vez mais distrações, maior é a possibilidade de eu não dar a atenção necessária pra eles porque tô distraído com outras coisas.

Sinto que saber lidar com essas distrações e não deixar que elas te atrapalhem vai ser uma habilidade cada vez mais importante pra nós.

Mas e aí, o que fazer? Acredito que estar ciente é o primeiro passo. Estar ciente de que existem "forças" maiores que nós que vão tentar nos fazer assistir, postar, consumir infinitamente. E nós profissionais de tecnologia estamos ainda mais suscetíveis à essas distrações porque estamos conectados literalmente o tempo todo.

Não tenho certeza quanto aos próximos passos depois disso. Acho que é algo que possamos tentar entender juntos com o tempo, não? O que você acha?

Vou contar pra vocês duas coisas que me ajudam:

  • Desabilitar notificações: não tenho notificação de nenhuma rede social, apenas Slack e Whatsapp (só pra mensagens direta, grupos são silenciados). Se eu já sinto vontade de checar o que tem de novo sem notificação nenhuma, imagine com o celular vibrando e tocando a cada 1 minuto com algo novo. Impossível.
  • Determinar horário de trabalho: tenho um horário específico pra trabalhar, que varia de dia pra dia dependendo da quantidade de da urgência de coisas que tenho pra fazer. Só tem uma regra: eu não trabalho depois das 18h (com exceção pra urgências, claro). Quanto eu não tô trabalhando, eu não penso em trabalho. Fico dias sem fazer nada ou pensar em absolutamente nada de trabalho. É possível trabalhar muito e descansar muito, uma coisa não exclui a outra. Requer foco e organização, mas é completamente possível.
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